sexta-feira, 29 de outubro de 2010

JOSÉ SARAMAGO - EMBARGO - Análise

         Li essa análise do conto “O embargo” de José Saramago elaborada pelo professor Anísio e achei muito interessante. Aproveitem a leitura.
JOSÉ SARAMAGO - EMBARGO
PROF: ANISIO

O HOMEM COMO VÍTIMA DO MUNDO MODERNO.

A situação que o nosso personagem se encontra dentro do automóvel vai se tornando cada vez mais angustiante, até chegar ao desespero. Não há como pedir ajuda, o homem é realmente só, não há como sair de dentro do carro, não há como se livrar de algo que já faz parte de si, ou de algo do que ele passou a ser parte. O desespero, a agonia, a aflição são os sentimentos bem retratados por esse homem embargado, num mundo cheio de burocracias e embargos. O homem só pensa em ficar distante da humanidade, e vai para longe, até onde ninguém possa vê-lo. Preso e humilhado diante da situação ele luta até não conseguir mais: “era como se quisesse levantar o mundo”.
O fato de a gasolina do carro ter acabado é intrigante. Teria acabado a gasolina e o carro parado e, como o homem e o carro já eram o “mesmo aço”,
acabaria também a sua força? Ou o fato de a gasolina terminar seria até engraçado, pois um homem saíra de um embargo – o problema com o carro – e entrado num outro, a falta de gasolina, a falta do automóvel?
São leituras possíveis dentro de um limite quase interminável do feixe sugestivo de Saramago. Esse homem moderno que está em total crise de identidade,que está só no mundo, que não consegue ficar parado,que depende de um meio político-econômico-social gerido pela globalização e por potências, mas que ainda se prende a certas superstições e arcaísmos.

JOSÉ SARAMAGO – EMBARGO

Um homem normal faz o que costuma fazer todos os dias. Acorda, se arruma, sai de casa, pega o seu carro. Mas esse dia se faz diferente. Depois de parar num posto de gasolina ele percebe que seu carro começa a ter vontade própria e pára em todo o posto que ofereça gasolina. Sabe-se que há um embargo de petróleo causado pelos árabes, esse embargo vai afetar o mundo inteiro, um resultado da globalização. Os postos de gasolina estão sempre com filas de automóveis em busca de combustível, que se tornou fonte rara. O carro que toma vida embarga a vida rotineira do homem, atrasa-o do trabalho. A perplexidade de ver o carro com vida faz o homem perceber que agora ele está preso dentro dele, grudado ao banco, impossibilitado de vontades, sozinho, sem ajuda.
 Há uma ligação intrínseca entre o conto e certas consequências causadas no ser humano pela nova relação instaurada pela globalização. Vemos um garoto que passa em frente ao prédio, mas ele passa bem vestido, todo coberto, como se quisesse se proteger de tudo, dos outros, do mundo. O individualismo, causado pela violência urbana, pelo uso da Internet como entretenimento, a desconfiança nas pessoas – nosso personagem vai pedir ajuda à mulher, mas teme os procedimentos dela, não confia na própria mulher – o homem cada vez mais só e fechado. A relação mais bem exposta no conto é mesmo a entre o homem e a máquina. Mostra o homem dependente dela, cada vez mais envolvido, cada vez mais estressado com os problemas que a máquina lhe causa. O ser humano é totalmente dependente de suas criações, e o carro, neste caso, é a representação mais perfeita desta dependência, tal máquina passa por um processo de transformação e aos poucos vai “impondo suas vontades ao homem”, o que na verdade poderia ser uma imposição do próprio homem, já tão materialista: “meu carro tá querendo um banho”, “ta desejando um bom óleo!”, quantas vezes não ouvimos frases como essas?

EMBARGO
A subserviência do homem frente à máquina.
Ele é um homem anônimo, como todos os outros de uma sociedade urbana. Um homem da classe média, social e ideologicamente domado. Casado com uma mulher com quem convive, em uma rotina onde o afeto se tornou algo artificial.
Aquele dia seria diferente, desde o sono interrompido, o silêncio no prédio ao rato morto na calçada, aquele dia seria diferente. Aquele rato morto é o símbolo do individualismo urbano. Está na calçada e por isso ninguém se preocupa em removê-lo, um absoluto descaso com o que é público, com o que é social. Mostra o grau de individualismo que caracteriza essa sociedade. Valem lembrar que a chuva vai remover o rato.
O veículo funciona e isso deixa o homem contente. É como se a felicidade humana estivesse intrinsecamente ligada ao funcionamento das máquinas criadas pelo homem.
Advém de um plano global: os árabes se recusaram a vender petróleo para o ocidente e isso estava afetando a vida diária, pois havia um racionamento de combustíveis e os postos de abastecimento estavam sempre lotados, aborrecendo o homem. Inicialmente, o motorista não percebe que seu carro está com vontade própria, mas está: acelera, ultrapassa e entra nos postos de abastecimento à revelia de seu dono.
José Saramago, Nobel/98: possui um olhar severo sobre o comportamento do homem que vive

As horas perdidas em postos de abastecimento, em itinerários confusos e congestionamentos, levam o homem à decisão de ir para o escritório onde trabalha. Mas ao tentar sair do veículo não consegue, pois está preso a ele.

O HOMEM OBJETUALIZADO OU COISIFICADO

Como sua vontade está sujeita a uma mais poderosa, o motorista passa por experiências humilhantes: considera-se ridiculamente preso; urina-se; foge de sua mulher que desconfia de sua sanidade mental.

O RETORNO À VIDA PRIMITIVA

O carro leva o homem para fora da cidade, na qual o embargo petroleiro fizera esgotarem-se todas as bombas. Seria uma metáfora da necessidade que o homem possui de se libertar da vida urbana, da civilização mecanizada.

TRECHO FINAL

Sentia fome. Urinara outra vez, humilhado demais para se envergonhar e delirava um pouco: humilhado, himolhado. Ia declinando sucessivamente, alterando as consoantes e as vogais, num exercício inconsciente e obsessivo que o defendia da realidade. Não parava porque não sabia para que iria parar. Mas, de madrugada, por duas vezes, encostou o carro a berma e tentou sair
devagarzinho, como se entretanto ele e o carro tivessem chegado a um acordo de pazes e fosse a altura de tirar a prova da boa-fé de cada um. Por duas vezes falou baixinho quando o assento o segurou, por duas vezes tentou convencer o automóvel a deixá-lo, por duas vezes num descampado nocturno e gelado, onde a chuva não parava, explodiu em gritos, em uivos, em lágrimas, em desespero cego. As feridas da cabeça e da mão voltaram a sangrar. E ele, soluçando, sufocado, gemendo como um animal aterrorizado, continuou a conduzir o carro. A deixar-se conduzir.
Toda a noite viajou sem saber por onde. Atravessou povoações de que não viu o nome, percorreu longas rectas, subiu e desceu montes, fez e desfez laços e deslaços de curvas, e quando a manhã começou a nascer estava em qualquer parte, numa estrada arruinada, onde a água da chuva se juntava em charcos arrepiados à superfície. O motor roncava poderosamente, arrancando as rodas à lama, e toda a estrutura do carro vibrava, com um som inquietante. A manhã abriu por completo, sem que o sol chegasse a mostrar-se, mas a chuva parou de repente. A estrada transformava-se num simples caminho, que adiante, a cada momento, parecia que se perdia entre pedras. Onde estava o mundo? Diante dos olhos eram serras e um céu espantosamente
baixo. Ele deu um grito e bateu com os punhos cerrados no volante. Foi nesse momento que viu que o ponteiro do indicador da gasolina estava em cima do zero. O motor pareceu arrancar-se a si mesmo e arrastou o carro por mais  lugar, mas a gasolina acabara.
 A testa cobriu-se-lhe de suor frio. Uma náusea agarrou nele e sacudiu-o dos pés a cabeça, um véu cobriu-lhe por três vezes os olhos. Às apalpadelas, abriu a porta para se libertar da sufocação que aí vinha, e nesse movimento, por que fosse morrer ou porque o motor morrera, o corpo pendeu para o lado esquerdo e escorregou do carro. Escorregou um pouco mais, e ficou deitado sobre as pedras. A chuva recomeçara a cair.



          José Saramago foi conhecido por utilizar um estilo oral, coevo dos contos de tradição oral populares em que a vivacidade da comunicação é mais importante do que a correcção de uma linguagem escrita. Todas as características de uma linguagem oral, predominantemente usada na oratória, na dialéctica, na retórica e que servem sobremaneira o seu estilo interventivo e persuasivo estão presentes. Assim, utiliza frases e períodos compridos, usando a pontuação de uma maneira não convencional; Os diálogos das personagens são inseridos nos próprios parágrafos que os antecedem, de forma que não existem travessões nos seus livros. Este tipo de marcação das falas propicia uma forte sensação de fluxo de consciência, a ponto do leitor chegar a confundir-se se um certo diálogo foi real ou apenas um pensamento. Muitas das suas frases (i.e. orações) ocupam mais de uma página, usando vírgulas onde a maioria dos escritores usaria pontos finais. Da mesma forma, muitos dos seus parágrafos ocupariam capítulos inteiros de outros autores. Por isso, se o leitor se habituar ao o seu estilo, a sua leitura é muito agradável, pois o seu ritmo está muito próximo da eloquência oral do Povo Português.
Estas características tornam o estilo de Saramago único na literatura contemporânea, sendo considerado por muitos críticos um mestre no tratamento da língua portuguesa. Em 2003, o crítico norte-americano Harold Bloom, no seu livro Genius: A Mosaic of One Hundred Exemplary Creative Minds ("Génio: Um Mosaico de Cem Exemplares Mentes Criativas"), considerou José Saramago "o mais talentoso romancista vivo nos dias de hoje" (tradução livre de the most gifted novelist alive in the world today), referindo-se a ele como "o Mestre". Declarou ainda que Saramago é "um dos últimos titãs de um género literário que se está a desvanecer".
           Para saber mais sobre esse renomado escritor pesquise no site abaixo.


PROJETO: TEATRO NA ESCOLA E FORA DA ESCOLA

          O projeto com teatro desenvolvido na Escola Luiz Paulino Mártires tem como um dos seus objetivos levar a arte da representação para os diversos públicos da cidade de Bragança. A intenção é continuar o projeto visando não apenas o amadurecimento crescente dos atores, mas, o engrandecimento dessa arte na tentativa de trazer uma opção a mais`ao gosto cultural do povo dessa região.
           Algumas escolas já receberam a visita do grupo,que pretende continuar o projeto inserindo mais alunos. Levando informação, arte, entretenimento e cultura, principalmente para as crianças.


O GRUPO NO CAMARIM IMPROVISADO

ÚLTIMOS RETOQUES

PROFESSORA LEILA E ALUNA APRESENTANDO O GRUPO

AS CRIANÇAS ASSISTINDO FASCINADAS




UM CONTO DE FADAS MODERNO




Depois da apresentação da primeira peça, a espera ansiosa pela segunda.


 As crianças empolgaram-se com a história e mais se aproximaram para acompanhar os acontecimentos.
O esforço dos alunos do 1º ano encantou as crianças






A curiosidade aproximando a criança do personagem


O grupo apresentando uma pantomima na Avenida principal de Bragança em pleno 7 de setembro 

O público analisando a apresentação

Os alunos mostrando o que aprenderam sobre a arte da dramatização


A peça "A droga é uma droga" apresentada no Lyons Club de Bragança. Uma mensagem sobre o mal que as drogas fazem aos seres humanos que emocionou o público.






terça-feira, 12 de outubro de 2010

Geundismo



 
A PRAGA DO "GERUNDISMO"
 

Frases como ..eu vou estar transferindo a ligação..
surgiram no telemarketing.
Mas já se instalaram no topo. lá na diretoria
......Não acredito no purismo linguístico, não. Desde que o homem é homem, as culturas e, consequentemente, as línguas se interpenetram. Hoje, quem é que reclama da palavra "otorrinolaringologista", todinha grega? Quem é que não usa a palavra "garagem" (ou "garage", tanto faz), que vem do francês? Mas (quase) tudo na vida tem limite. Em se tratando da língua, ou, mais especificamente, dos estrangeirismos, o limite é imposto pelo bom senso. Não vejo o menor sentido, por exemplo, no tosco uso da palavra off, que aparece na porta de algumas lojas. Não se trata de caso que enriquece a língua, que preenche espaço até então vago etc. Trata-se de subdesenvolvimento mesmo. Incurável. Ou, como dizia Nelson Rodrigues, do complexo de vira-lata. No lugar de off, parece conveniente usar a ultraconhecida palavra "desconto", cujo significado qualquer brasileiro conhece. ......Que me diz o leitor de traduzir "Smoking is not allowed" por ''Fumando não é permitido"? Alguém teria coragem de traduzir smoking por "fumando" nesse caso? Certamente não, mas muita gente traduz ao pé da letra frases como "I will be sending" ou "We will be booking" (por "Vou estar enviando" e "Vamos estar reservando", respectivamente). Como se vê pela mensagem com que se avisa que não é permitido fumar, o gerúndio inglês nem sempre continua gerúndio quando traduzido para o português. ......Onde estaria a inadequação de frases como "O senhor pode estar anotando o número?" ou ''Um minuto, que eu vou estar transferindo a ligação", que hoje em dia pululam e ecoam nos escritórios, no telemarketing etc.? O problema não está na estrutura - "flexão dos verbos 'ir', 'poder' etc. + estar + gerúndio" -, mas no mau uso que dela se tem feito. Essas construções são da nossa língua há séculos, ou alguém teria peito de dizer que uma frase como ''Eu bem que poderia estar dormindo" é inadequada? ......Qual é o problema então? Vamos lá. ......Quando se diz, por exemplo, "Não me telefone nessa hora, porque eu vou estar almoçando", indica-se um processo (o almoço) que terá certa duração, que estará em curso, mas - santo Deus! -, quando se diz ''Um minuto, que eu vou estar transferindo a ligação", emprega-se a construção "vou estar transferindo" para que se indique um processo que se realiza imediatamente. Quanto tempo se leva para a transferência de uma ligação? Meses ou segundos? O diabo é que, para piorar, "Vou estar transferindo" é uma verdadeira contorção verbal, que substitui, sem nenhuma vantagem, a construção "Vou transferir", mais curta, rápida, direta - e apropriada. ......A moda do "gerundismo" (essa de "O senhor tem que estar pegando uma senha", "Vamos ter que estar trocando a embreagem do seu carro", "Ela vai precisar estar voltando aqui amanhã", "A empresa vai poder estar fornecendo as peças" e outras ultrachatices semelhantes) só tem uma coisa de bom: o caráter democrático. ......Traduzo: a praga pegou da telefonista ao gerente, da faxineira ao diretor-presidente. ......E quem começou tudo isso? Não se sabe, mas me atrevo a dizer que nasceu da tradução literal do inglês (de manuais ou assemelhados). ......Recentemente, um motorista me disse: "Professor, agora o senhor vai ter que estar me dizendo em que rua eu vou ter que estar entrando". Se eu tivesse levado a sério a pergunta dele, deveria ter respondido isto: "Naquela rua, naquela rua, naquela rua, naquela rua, naquela rua, naquela rua, naquela rua, naquela rua...". E, assim que ele entrasse na tal rua, eu deveria exigir que ele parasse o carro, engatasse a ré e ficasse entrando e saindo da rua (ou entrando na rua e saindo dela, como preferem os que amam a sintaxe. rigorosa), até moer a embreagem, os pneus... Até o gerundismo sumir do mapa!

Pasquale Cipro Neto é professor de língua portuguesa. consultor e colunista de diversos órgãos da imprensa e o idealizador e apresentador do programa Nossa Língua Portuguesa, da TV Cultura.
Este seu artigo foi publicado na edição nº1894 da Revista Veja..

domingo, 3 de outubro de 2010

Fotos da Peça "A cartomante" de Machado de Assis e adaptada para o teatro.

          No ano 2008 a Escola Luíz Paulino Mártires homenageou no Sarau Literário o ilustre escritor Machado de Assis. Para esse dia adaptei para o teatro o conto "A Cartomante" encenada pelos alunos do 2ºano com brilhantismo.
 

Machado de Assis
MACHADO DE ASSIS

A CARTOMANTE
Machado de Assis

       Hamlet observa a Horácio que há mais cousas no céu e na terra do que sonha a nossa filosofia. Era a mesma explicação que dava a bela Rita ao moço Camilo, numa sexta-feira de Novembro de 1869, quando este ria dela, por ter ido na véspera consultar uma cartomante; a diferença é que o fazia por outras palavras.
      — Ria, ria. Os homens são assim; não acreditam em nada. Pois saiba que fui, e que ela adivinhou o motivo da consulta, antes mesmo que eu lhe dissesse o que era. Apenas começou a botar as cartas, disse-me: "A senhora gosta de uma pessoa..." Confessei que sim, e então ela continuou a botar as cartas, combinou-as, e no fim declarou-me que eu tinha medo de que você me esquecesse, mas que não era verdade...
       — Errou! Interrompeu Camilo, rindo.
       — Não diga isso, Camilo. Se você soubesse como eu tenho andado, por sua causa. Você sabe; já lhe disse. Não ria de mim, não ria...
       Camilo pegou-lhe nas mãos, e olhou para ela sério e fixo. Jurou que lhe queria muito, que os seus sustos pareciam de criança; em todo o caso, quando tivesse algum receio, a melhor cartomante era ele mesmo. Depois, repreendeu-a; disse-lhe que era imprudente andar por essas casas. Vilela podia sabê-lo, e depois...
       — Qual saber! tive muita cautela, ao entrar na casa.
       — Onde é a casa?
       — Aqui perto, na rua da Guarda Velha; não passava ninguém nessa ocasião. Descansa; eu não sou maluca.
Camilo riu outra vez:
      — Tu crês deveras nessas coisas? perguntou-lhe.
       Foi então que ela, sem saber que traduzia Hamlet em vulgar, disse-lhe que havia muito cousa misteriosa e verdadeira neste mundo. Se ele não acreditava, paciência; mas o certo é que a cartomante adivinhara tudo. Que mais? A prova é que ela agora estava tranqüila e satisfeita.
Cuido que ele ia falar, mas reprimiu-se, Não queria arrancar-lhe as ilusões. Também ele, em criança, e ainda depois, foi supersticioso, teve um arsenal inteiro de crendices, que a mãe lhe incutiu e que aos vinte anos desapareceram. No dia em que deixou cair toda essa vegetação parasita, e ficou só o tronco da religião, ele, como tivesse recebido da mãe ambos os ensinos, envolveu-os na mesma dúvida, e logo depois em uma só negação total. Camilo não acreditava em nada. Por quê? Não poderia dizê-lo, não possuía um só argumento; limitava-se a negar tudo. E digo mal, porque negar é ainda afirmar, e ele não formulava a incredulidade; diante do mistério, contentou-se em levantar os ombros, e foi andando.
Separaram-se contentes, ele ainda mais que ela. Rita estava certa de ser amada; Camilo, não só o estava, mas via-a estremecer e arriscar-se por ele, correr às cartomantes, e, por mais que a repreendesse, não podia deixar de sentir-se lisonjeado. A casa do encontro era na antiga rua dos Barbonos, onde morava uma comprovinciana de Rita. Esta desceu pela rua das Mangueiras, na direção de Botafogo, onde residia; Camilo desceu pela da Guarda velha, olhando de passagem para a casa da cartomante.
        Vilela, Camilo e Rita, três nomes, uma aventura, e nenhuma explicação das origens. Vamos a ela. Os dois primeiros eram amigos de infância. Vilela seguiu a carreira de magistrado. Camilo entrou no funcionalismo, contra a vontade do pai, que queria vê-lo médico; mas o pai morreu, e Camilo preferiu não ser nada, até que a mãe lhe arranjou um emprego público. No princípio de 1869, voltou Vilela da província, onde casara com uma dama formosa e tonta; abandonou a magistratura e veio abrir banca de advogado. Camilo arranjou-lhe casa para os lados de Botafogo, e foi a bordo recebê-lo.
     — É o senhor? exclamou Rita, estendendo-lhe a mão. Não imagina como meu marido é seu amigo; falava sempre do senhor.
        Camilo e Vilela olharam-se com ternura. Eram amigos deveras. Depois, Camilo confessou de si para si que a mulher do Vilela não desmentia as cartas do marido. Realmente, era graciosa e viva nos gestos, olhos cálidos, boca fina e interrogativa. Era um pouco mais velha que ambos: contava trinta anos, Vilela vinte e nove e Camilo vente e seis. Entretanto, o porte grave de Vilela fazia-o parecer mais velho que a mulher, enquanto Camilo era um ingênuo na vida moral e prática. Faltava-lhe tanto a ação do tempo, como os óculos de cristal, que a natureza põe no berço de alguns para adiantar os anos. Nem experiência, nem intuição.
        Uniram-se os três. Convivência trouxe intimidade. Pouco depois morreu a mãe de Camilo, e nesse desastre, que o foi, os dois mostraram-se grandes amigos dele. Vilela cuidou do enterro, dos sufrágios e do inventário; Rita tratou especialmente do coração, e ninguém o faria melhor.
Como daí chegaram ao amor, não o soube ele nunca. A verdade é que gostava de passar as horas ao lado dela; era a sua enfermeira moral, quase uma irmã, mas principalmente era mulher e bonita. Odor di femina: eis o que ele aspirava nela, e em volta dela, para incorporá-lo em si próprio. Liam os mesmos livros, iam juntos a teatros e passeios. Camilo ensinou-lhe as damas e o xadrez e jogavam às noites; — ela mal, — ele, para lhe ser agradável, pouco menos mal. Até aí as cousas. Agora a ação da pessoa, os olhos teimosos de Rita, que procuravam muita vez os dele, que os consultavam antes de o fazer ao marido, as mãos frias, as atitudes insólitas. Um dia, fazendo ele anos, recebeu de Vilela uma rica bengala de presente, e de Rita apenas um cartão com um vulgar cumprimento a lápis, e foi então que ele pôde ler no próprio coração; não conseguia arrancar os olhos do bilhetinho. Palavras vulgares; mas há vulgaridades sublimes, ou, pelo menos, deleitosas. A velha caleça de praça, em que pela primeira vez passeaste com a mulher amada, fechadinhos ambos, vale o carro de Apolo. Assim é o homem, assim são as cousas que o cercam.
        Camilo quis sinceramente fugir, mas já não pôde. Rita como uma serpente, foi-se acercando dele, envolveu-o todo, fez-lhe estalar os ossos num espasmo, e pingou-lhe o veneno na boca. Ele ficou atordoado e subjugado. Vexame, sustos, remorsos, desejos, tudo sentiu de mistura; mas a batalha foi curta e a vitória delirante. Adeus, escrúpulos! Não tardou que o sapato se acomodasse ao pé, e aí foram ambos, estrada fora, braços dados, pisando folgadamente por cima de ervas e pedregulhos, sem padecer nada mais que algumas saudades, quando estavam ausentes um do outro. A confiança e estima de Vilela continuavam a ser as mesmas.
        Um dia, porém, recebeu Camilo uma carta anônima, que lhe chamava imoral e pérfido, e dizia que a aventura era sabida de todos. Camilo teve medo, e, para desviar as suspeitas, começou a rarear as visitas à casa de Vilela. Este notou-lhe as ausências. Camilo respondeu que o motivo era uma paixão frívola de rapaz. Candura gerou astúcia. As ausências prolongaram-se, e as visitas cessaram inteiramente. Pode ser que entrasse também nisso um pouco de amor-próprio, uma intenção de diminuir os obséquios do marido, para tornar menos dura a aleivosia do ato.
        Foi por esse tempo que Rita, desconfiada e medrosa, correu à cartomante para consultá-la sobre a verdadeira causa do procedimento de Camilo. Vimos que a cartomante restituiu-lhe a confiança, e que o rapaz repreendeu-a por ter feito o que fez. Correram ainda algumas semanas. Camilo recebeu mais duas ou três cartas anônimas, tão apaixonadas, que não podiam ser advertência da virtude, mas despeito de algum pretendente; tal foi a opinião de Rita, que, por outras palavras mal compostas, formulou este pensamento: — a virtude é preguiçosa e avara, não gasta tempo nem papel; só o interesse é ativo e pródigo.
       Nem por isso Camilo ficou mais sossegado; temia que o anônimo fosse ter com Vilela, e a catástrofe viria então sem remédio. Rita concordou que era possível.
       — Bem, disse ela; eu levo os sobrescritos para comparar a letra com a das cartas que lá aparecerem; se alguma for igual, guardo-a e rasgo-a...
        Nenhuma apareceu; mas daí a algum tempo Vilela começou a mostrar-se sombrio, falando pouco, como desconfiado. Rita deu-se pressa em dizê-lo ao outro, e sobre isso deliberaram. A opinião dela é que Camilo devia tornar à casa deles, tatear o marido, e pode ser até que lhe ouvisse a confidência de algum negócio particular. Camilo divergia; aparecer depois de tantos meses era confirmar a suspeita ou denúncia. Mais valia acautelarem-se, sacrificando-se por algumas semanas. Combinaram os meios de se corresponderem, em caso de necessidade, e separaram-se com lágrimas.
       No dia seguinte, estando na repartição, recebeu Camilo este bilhete de Vilela: "Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te sem demora." Era mais de meio-dia. Camilo saiu logo; na rua, advertiu que teria sido mais natural chamá-lo ao escritório; por que em casa? Tudo indicava matéria especial, e a letra, fosse realidade ou ilusão, afigurou-se-lhe trêmula. Ele combinou todas essas cousas com a notícia da véspera.
        — Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te sem demora, — repetia ele com os olhos no papel.
        Imaginariamente, viu a ponta da orelha de um drama, Rita subjugada e lacrimosa, Vilela indignado, pegando na pena e escrevendo o bilhete, certo de que ele acudiria, e esperando-o para matá-lo. Camilo estremeceu, tinha medo: depois sorriu amarelo, e em todo caso repugnava-lhe a idéia de recuar, e foi andando. De caminho, lembrou-se de ir a casa; podia achar algum recado de Rita, que lhe explicasse tudo. Não achou nada, nem ninguém. Voltou à rua, e a idéia de estarem descobertos parecia-lhe cada vez mais verossímil; era natural uma denúncia anônima, até da própria pessoa que o ameaçara antes; podia ser que Vilela conhecesse agora tudo. A mesma suspensão das suas visitas, sem motivo aparente, apenas com um pretexto fútil, viria confirmar o resto.
       Camilo ia andando inquieto e nervoso. Não relia o bilhete, mas as palavras estavam decoradas, diante dos olhos, fixas; ou então, — o que era ainda peior, — eram-lhe murmuradas ao ouvido, com a própria voz de Vilela. "Vem já, já à nossa casa; preciso falar-te sem demora." Ditas, assim, pela voz do outro, tinham um tom de mistério e ameaça. Vem, já, já, para quê? Era perto de uma hora da tarde. A comoção crescia de minuto a minuto. Tanto imaginou o que se iria passar, que chegou a crê-lo e vê-lo. Positivamente, tinha medo. Entrou a cogitar em ir armado, considerando que, se nada houvesse, nada perdia, e a precaução era útil. Logo depois rejeitava a idéa, vexado de si mesmo, e seguia, picando o passo, na direção do largo da Carioca, para entrar num tílburi. Chegou, entrou e mandou seguir a trote largo.
       — Quanto antes, melhor, pensou ele; não posso estar assim...
       Mas o mesmo trote do cavalo veio agravar-lhe a comoção. O tempo voava, e ele não tardaria a entestar com o perigo. Quase no fim da rua da Guarda Velha, o tílburi teve de parar; a rua estava atravancada com uma carroça, que caíra. Camilo, em si mesmo, estimou o obstáculo, e esperou. No fim de cinco minutos, reparou que ao lado, à esquerda, ao pé do tílburi, ficava a casa da cartomante, a quem Rita consultara uma vez, e nunca ele desejou tanto crer na lição das cartas. Olhou, viu as janelas fechadas, quando todas as outras estavam abertas e pejadas de curiosos do incidente da rua. Dir-se-ia a morada do indiferente Destino.
       Camilo reclinou-se no tílburi, para não ver nada. A agitação dele era grande, extraordinária, e do fundo das camadas morais emergiam alguns fantasmas de outro tempo, as velhas crenças, as superstições antigas. O cocheiro propôs-lhe voltar a primeira travessa, e ir por outro caminho; ele respondeu que não, que esperasse. E inclinava-se para fitar a casa... Depois fez um gesto incrédulo: era a idéia de ouvir a cartomante, que lhe passava ao longe, muito longe, com vastas asas cinzentas; desapareceu, reapareceu, e tornou a esvair-se no cérebro; mas daí a pouco moveu outra vez as asas, mais perto, fazendo uns giros concêntricos... Na rua, gritavam os homens, safando a carroça:
      — Anda! agora! empurra! vá! vá!
      Daí a pouco estaria removido o obstáculo. Camilo fechava os olhos, pensava em outras cousas; mas a voz do marido sussurrava-lhe às orelhas as palavras da carta: "Vem já, já..." E ele via as contorções do drama e tremia. A casa olhava para ele. As pernas queriam descer e entrar... Camilo achou-se diante de um longo véu opaco... pensou rapidamente no inexplicável de tantas cousas. A voz da mãe repetia-lhe uma porção de casos extraordinários; e a mesma frase do príncipe de Dinamarca reboava-lhe dentro: "Há mais cousas no céu e na terra do que sonha a filosofia..." Que perdia ele, se...?
        Deu por si na calçada, ao pé da porta; disse ao cocheiro que esperasse, e rápido enfiou pelo corredor, e subiu a escada. A luz era pouca, os degraus comidos dos pés, o corrimão pegajoso; mas ele não viu nem sentiu nada. Trepou e bateu. Não aparecendo ninguém, teve idéia de descer; mas era tarde, a curiosidade fustigava-lhe o sangue, as fontes latejavam-lhe; ele tornou a bater uma, duas, três pancadas. Veio uma mulher; era a cartomante. Camilo disse que ia consultá-la, ela fê-lo entrar. Dali subiram ao sótão, por uma escada ainda pior que a primeira e mais escura. Em cima, havia uma salinha, mal alumiada por uma janela, que dava para os telhados do fundo. Velhos trastes, paredes sombrias, um ar de pobreza, que antes aumentava do que destruía o prestígio.
        A cartomante fê-lo sentar diante da mesa, e sentou-se do lado oposto, com as costas para a janela, de maneira que a pouca luz de fora batia em cheio no rosto de Camilo. Abriu uma gaveta e tirou um baralho de cartas compridas e enxovalhadas. Enquanto as baralhava, rapidamente, olhava para ele, não de rosto, mas por baixo dos olhos. Era uma mulher de quarenta anos, italiana, morena e magra, com grandes olhos sonsos e agudos. Voltou três cartas sobre a mesa, e disse-lhe:
       — Vejamos primeiro o que é que o traz aqui. O senhor tem um grande susto...
Camilo, maravilhado, fez um gesto afirmativo.
      — E quer saber, continuou ela, se lhe acontecerá alguma coisa ou não...
      — A mim e a ela, explicou vivamente ele.
      A cartomante não sorriu; disse-lhe só que esperasse. Rápido pegou outra vez as cartas e baralhou-as, com os longos dedos finos, de unhas descuradas; baralhou-as bem, transpôs os maços, uma, duas, três vezes; depois começou a estendê-las. Camilo tinha os olhos nela, curioso e ansioso.
       — As cartas dizem-me...
       Camilo inclinou-se para beber uma a uma as palavras. Então ela declarou-lhe que não tivesse medo de nada. Nada aconteceria nem a um nem a outro; ele, o terceiro, ignorava tudo. Não obstante, era indispensável mais cautela; ferviam invejas e despeitos. Falou-lhe do amor que os ligava, da beleza de Rita... Camilo estava deslumbrado. A cartomante acabou, recolheu as cartas e fechou-as na gaveta.
       — A senhora restituiu-me a paz ao espírito, disse ele estendendo a mão por cima da mesa e     apertando a da cartomante.
Esta levantou-se, rindo.
       — Vá, disse ela; vá, ragazzo innamorato...
       E de pé, com o dedo indicador, tocou-lhe na testa. Camilo estremeceu, como se fosse mão da própria sibila, e levantou-se também. A cartomante foi à cômoda, sobre a qual estava um prato com passas, tirou um cacho destas, começou a despencá-las e comê-las, mostrando duas fileiras de dentes que desmentiam as unhas. Nessa mesma ação comum, a mulher tinha um ar particular. Camilo, ansioso por sair, não sabia como pagasse; ignorava o preço.
      — Passas custam dinheiro, disse ele afinal, tirando a carteira. Quantas quer mandar buscar?
      — Pergunte ao seu coração, respondeu ela.
Camilo tirou uma nota de dez mil-réis, e deu-lha. Os olhos da cartomante fuzilaram. O preço usual era dois mil-réis.
       — Vejo bem que o senhor gosta muito dela... E faz bem; ela gosta muito do senhor. Vá, vá tranqüilo. Olhe a escada, é escura; ponha o chapéu...
        A cartomante tinha já guardado a nota na algibeira, e descia com ele, falando, com um leve sotaque. Camilo despediu-se dela embaixo, e desceu a escada que levava à rua, enquanto a cartomante alegre com a paga, tornava acima, cantarolando uma barcarola. Camilo achou o tílburi esperando; a rua estava livre. Entrou e seguiu a trote largo.
        Tudo lhe parecia agora melhor, as outras cousas traziam outro aspecto, o céu estava límpido e as caras joviais. Chegou a rir dos seus receios, que chamou pueris; recordou os termos da carta de Vilela e reconheceu que eram íntimos e familiares. Onde é que ele lhe descobrira a ameaça? Advertiu também que eram urgentes, e que fizera mal em demorar-se tanto; podia ser algum negócio grave e gravíssimo.
         — Vamos, vamos depressa, repetia ele ao cocheiro.
         E consigo, para explicar a demora ao amigo, engenhou qualquer cousa; parece que formou também o plano de aproveitar o incidente para tornar à antiga assiduidade... De volta com os planos, reboavam-lhe na alma as palavras da cartomante. Em verdade, ela adivinhara o objeto da consulta, o estado dele, a existência de um terceiro; por que não adivinharia o resto? O presente que se ignora vale o futuro. Era assim, lentas e contínuas, que as velhas crenças do rapaz iam tornando ao de cima, e o mistério empolgava-o com as unhas de ferro. Às vezes queria rir, e ria de si mesmo, algo vexado; mas a mulher, as cartas, as palavras secas e afirmativas, a exortação: — Vá, vá, ragazzo innamorato; e no fim, ao longe, a barcarola da despedida, lenta e graciosa, tais eram os elementos recentes, que formavam, com os antigos, uma fé nova e vivaz.
A verdade é que o coração ia alegre e impaciente, pensando nas horas felizes de outrora e nas que haviam de vir. Ao passar pela Glória, Camilo olhou para o mar, estendeu os olhos para fora, até onde a água e o céu dão um abraço infinito, e teve assim uma sensação do futuro, longo, longo, interminável.
Daí a pouco chegou à casa de Vilela. Apeou-se, empurrou a porta de ferro do jardim e entrou. A casa estava silenciosa. Subiu os seis degraus de pedra, e mal teve tempo de bater, a porta abriu-se, e apareceu-lhe Vilela.
        — Desculpa, não pude vir mais cedo; que há?
Vilela não lhe respondeu; tinha as feições decompostas; fez-lhe sinal, e foram para uma saleta interior. Entrando, Camilo não pôde sufocar um grito de terror: — ao fundo sobre o canapé, estava Rita morta e ensangüentada. Vilela pegou-o pela gola, e, com dois tiros de revólver, estirou-o morto no chão.
Gazeta de Notícias - Rio de Janeiro, em 1884. Posteriormente foi incluído no livro "Várias Histórias" e em "Contos: Uma Antologia", Companhia das Letras - São Paulo, 1998, de onde foi extraído. Com esta publicação homenageamos Machado de Assis que, no dia 21 deste, estaria completando seu 172° aniversário.


APRESENTAÇÃO DA MESMA PEÇA NO MUSEU DA MARUJADA






sábado, 2 de outubro de 2010

A HORA DO CONTO NA ESCOLA LUIZ PAULINO COM ALUNOS DO 1º ANO

INFORMAÇÕES SOBRE O TEATRO
As informações aqui contidas foram retiradas da monografia (Teatro, Transversalidade, Educação) que escrevi para conclusão da minha pós graduação em Língua Portuguesa e Literatura(Leila Nascimento)
          Para um grupo de atores ainda em processo de amadurecimento intelectual, o texto unido às apresentações provoca também um impacto emocional tanto nos atores quanto na platéia, elevando o grau de percepção e de análise. Isso fará com que a leitura de mundo dos atores também se modifique a cada nova percepção. Portanto, a ligação que há entre espetáculo e platéia, também ocorre entre atores e textos, mas, de uma forma diversificada, pois, os atores têm a oportunidade de discutirem com mais precisão os objetivos do tema a ser trabalhado, de mergulharem, de viverem os conflitos e as particularidades dos personagens de forma a incorporá-los e com isso poderem alcançar seus graus de maturidade, assim podendo avaliá-los de forma bem mais precisa e real.
          Levando em consideração o fato de que o teatro possui uma linguagem universal, podemos dizer que é inerente ao ser humano porque se faz a partir dos seus comportamentos, sentimentos e contradições, o que na escola pode ser trabalhado de forma criativa, pois os alunos estão em busca de entender sua função no mundo e para que amadureçam satisfatoriamente, precisam aprender a conhecer-se como seres racionais e propícios a dúvidas, mas, capazes de encontrar caminhos em quaisquer dificuldades. Diante disso, ao imitar a vida, o teatro coloca em cena as relações mais profundas do comportamento humano. Desmascara o que a sociedade tenta ocultar, possibilitando uma análise mais apurada das atitudes do ser humano diante da vida e de sua realidade.
          Trabalhando o teatro na escola, os alunos acabam aprendendo que a vida tem um significado muito mais amplo do que estamos acostumados a vislumbrar; que a leitura do mundo e dos comportamentos pode ser mais abrangente e que a simples visão do superficial não é o suficiente para entendermos o ser humano e seus conflitos. E a vida é cheia de problemas rondando a realidade da maioria dos alunos, que a descobrem muito cedo com olhos de dúvida, de incompreensão. Mas, que precisam reconhecer-se como seres capazes de avaliar seus sentimentos e fortalecê-los, no sentido de conseguir atingir os seus objetivos.
          Os temas transversais dão ao professor muitas possibilidades de a partir das artes dramáticas, dar aos alunos a oportunidade de entender o mundo, conhecer-se como ser modificador e assim capaz de transformar a sua própria realidade, e da sua comunidade. Querer ir além é uma conquista que requer muita força de vontade e senso de percepção.
           O teatro através da transversalidade é uma ponte que liga os alunos e a escola a uma visão mais abrangente do processo educacional ao questionar o ser humano para o despertar de sua originalidade, ao conhecimento de si mesmo, por isso está em constante mudança, buscando sempre se atualizar para conseguir atingir a sociedade na sua performance em processo de transformação contínua, por isso não têm objetivos definitivos, de forma que seus pensamentos e ações são sempre renovados e estão ao alcance das sociedades e seu processo de evolução, atraindo o público, descobrindo seus valores e desejos e com isso conseguindo penetrar nos gostos mais íntimos de cada espectador, conquistando eternamente o seu público que apesar de variar a cada período, a cada espetáculo, está sempre presente, disposto a aplaudir.
           Claro que nem sempre nos deparamos com um espetáculo que agrade ao gosto particular de cada um, mas, os organizadores dos mesmos devem estar sempre dispostos de a partir das críticas, repensarem e reconstruírem novas idéias em busca dos aplausos de reconhecimento e respeito.
          Na escola, esse reconhecimento ocorre a partir da visão que os alunos têm do trabalho do professor e dos resultados obtidos. Na maneira como escola e professores tentam conquistar o seu público, descobrir seus valores e desejos e com isso conseguir penetrar nas necessidades de cada um, nas suas dificuldades, possibilitando que esse aluno não se amedronte diante das dificuldades e passe a ver o espaço escolar como um universo transformador. E a partir desse reconhecimento a escola conquistará seu público, que estará sempre disposto e preparado para aplaudi-la por saber analisar sua performance e avaliar os seus resultados, pois, os professores e demais funcionários estarão sempre dispostos a fazerem das críticas uma ponte que os ligará a uma busca constante pelo conhecimento.
O teatro é apenas um dos recursos que o professor pode utilizar para atingir seus objetivos no processo educacional, pois, sabemos existir muitas outras formas. Em se tratando de educação o professor deve se sentir um eterno pesquisador. O teatro foi uma de minhas pesquisas entre tantas outras, e não me sinto satisfeita, quero muito mais. Como educadora sou responsável não apenas pelo amadurecimento dos meus alunos, mas pelo meu próprio amadurecimento.
O que mais me chamou atenção com o teatro foi à grandiosidade dos resultados obtidos e as dificuldades que o professor enfrenta para conseguir executá-lo. É um contraste, mas essa realidade faz com que a maioria dos professores busque outras formas mais simplificadas de trabalhar o processo artístico mesmo que não obtenham grandes progressos. Com isso os alunos perdem em conhecimentos e os professores perdem em aprendizados, porque não crescem também.
A natureza do ser humano no decorrer dos séculos mostrou que a persistência é uma de nossas características mais marcantes, que sempre nos impulsionou em busca de grandes conquistas e não podemos permitir que justamente no que há de mais importante na vida, que é o desenvolvimento educacional, nos conformemos com pouco e venhamos a aceitar a derrota antes de tentar a conquista, a nos acomodar, a arquivar os nossos sonhos sem saber ao menos que resultados teríamos se tentássemos lutar por eles. 
Muitas experiências com o teatro provaram a sua eficácia no desenvolvimento corporal e intelectual do ser humano, por causa disso, muitas empresas estão aderindo a criação de grupos de teatro entre seus funcionários para trabalharem a alto estima, a convivência, postura e outros. A escola deve favorecer formas dinamizadoras de educar, abrindo suas portas para novas possibilidades, capazes de aproximar os alunos, de fazê-los terem uma visão mais abrangente da que estavam acostumados e com essa visão saibam procurar na sua realidade o que realmente lhes é favorável. Que saibam escolher caminhos e que reconheçam principalmente a Importância da Educação na Vida das Pessoas. 


            Nesse ano(2010) um novo grupo foi formado, porém preservando o mesmo nome "Arte Lupama". O grupo surgiu a partir de um curso de teatro que ministrei no ano passado e que também envolvia criação de textos teatrais, de forma que os alunos estão encenando suas próprias criações. Duas delas mostradas aqui.
            Sinto-me cada vez mais emocionada com os resultados obtidos. Cada apresentação soa como poesia declamada no palco, ou como uma pintura em cores que encantam. É lindo. E precisa ser visto e admirado porque eles merecem.
             Os alunos da Escola Luiz Paulino estão encantados com a arte da dramatização e crescem cada vez mais a cada apresentação.

O GRUPO
A PREPARAÇÃO
MOTIVAÇÃO
              DAIANE CONTANDO HISTÓRIAS PARA A PLATÉIA
DEU A LOUCA NAS PRINCESAS (PEÇA CRIADA PELA ALUNA JAYNE QUE APARECE VESTIDA DE BRUXA)












CINDERELA MODERNA
ADAPTAÇÃO FEITA PELAS ALUNAS HELLEN E MICHELE